A noite passada estava sem sono, às escuras dirigi-me pelo tacto até à sala grande, sentei-me no sofá que fica de costas para a lareira. Aí fiquei no negro da noite pensando nos enredos das minhas fantasias para o livro “Inertes com vida! Nada me vinha à mente, por isso concentrei-me no barulho do silêncio e nas memórias do nada. Comecei a viajar no passado, como observador somente. Subitamente comecei a ouvir vozes que iam pouco a pouco subindo de tom. Era uma algaraviada difícil de entender, pareciam canas rachadas com som metálico. Apurei o ouvido, para entender as falas o que consegui com esforço. Dizia um:
--Vocês são todos uns pantomineiros! O mais importante, sou eu! Sou o mais velho e o primeiro de uma longa saga.
Sem nada dizer, pensei. Quem será o pateta que assim fala? Depois outra voz se ouviu acima da confusão.
--Não digas disparates, já viste o teu tamanho? Se não te puserem um pedestal ninguém te vê. Raio de anão que não se reduz à sua insignificância. Sou maior que tu e represento uma cidade e tu uma vilazita.
No meio do meu silêncio falei para dentro de mim. Isto está bonito, vamos ver o que vai dar. Entretanto uma terceira fala entrou na conversa.
--Vocês estão cegos pela vaidade, nada valem. Um é pequeno e torto, o outro é grande mas marreco. Além disso representam um país em decadência. Igual a mim, só o meu irmão mais novo um ano, nós representamos um país imenso e belo.
Sempre calado para não dar nas vistas queria ouvir para saber aonde chegaria aquela conversa da treta. Mais um entrou na liça.
--Porque razão são todos uns pedantes? Para já representam uma modalidade em vias de desaparecer. Eu sim sou o maior, o meu país é pequeno mas a modalidade é universal. Alem disso sou mais bonito que vocês. Um é minúsculo e sem graça, outro grande e ferrugento, outro tem uma mão de cada cor e o outro, uma esfera armilar empenada.
Aquilo estava a ficar uma tremenda confusão, começava a ficar com medo da tragédia que se sentia na noite. Então uma voz grossa se sobrepôs a todos.
--Que são vocês comparados comigo? Atingi o topo da carreira e fui senhor da nação!
Houve um breve silêncio. Depois começaram todos a falar ao mesmo tempo e cada vez com mais agressividade. Aos berros, aos guinchos, parecia uma batalha campal.
Não aguentei mais. Precisava de entrevir antes da desgraça. Bruscamente levantei-me, acendi as luzes e dando um violento murro na mesa, decretei.
--Tudo calado, seus filhos de uma oficina, o vosso mérito não é nenhum! O vosso valor é zero! Tudo o que vocês dizem ser, foi à minha custa e do meu neto.
Então, num instante, todos ficaram quietos, num total silêncio, as taças, os troféus e as medalhas!
Bray 8/6/2012
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