Esta folha de papel quadriculado, a4 de tamanho, até há pouco solitária e vazia começa agora a ganhar vida, através da seiva preta da minha caneta. A vida dela própria, vida sem rumo, nem desejo, vida da vida que há-de vir. O espaço em branco vai diminuindo ao ritmo da entrada das palavras. O papel treme de emoção e desejo, quer mais, mais e mais. Quer conhecer o prazer através das palavras que deslizam na quadrícula da folha. Folha e papel têm o destino traçado, para eles isso não tem significado. Muitas palavras, algumas de uma só letra, outras chegam á dezena. Por vezes uma só letra significa mais que extensas palavras. A folha de papel já sorri, agora já está mais composta. Sente que está cumprindo a sua função. Parir letras e construir palavras é a sua ambição, coisa que não pode fazer sem colaboração, desejos que não podem ser cumpridos, sem a tinta da caneta e a mão que a desliza. O fim da folha de papel em branco, não está longe, ela sente nostalgia nesse tão provável fim. Sente que cumpriu a missão para que foi criada, usada e abusada, ela sente o parto sem dor e fica ansiosa para conhecer o recém-parido, para testar se mereceu ter vindo à vida e esperar que alguém escreva na folha de papel solitária, que alguém seja digno da humilde folha de papel, que não mais quer do que honra na escrita feita no seu corpo.
Bray, 1/6/2012
Uma folha em branco não representa nada, só tem valor após receber palavras.
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