Um homem idoso na idade mas jovem no espírito, o senhor
X, passou horas e horas fazendo aquele importante projecto. A sua empresa
precisava de vender os materiais referentes a essa obra, para salvar os números
do ano.
Tratava-se de um
armazém de grandes dimensões para uma cadeia de Super Mercados. Obra de envergadura
e muita complexidade. O senhor X desenhou durante o dia e continuou pela noite
fora, após idealizar a solução arquitectónica. Depois passou à parte de
engenharia, calculando todos esforços da estrutura. Calculou a resistência à
tracção e à compressão, dos pilares, vigas e diagonais. Previu travamentos.
Tudo foi pensado, calculado e revisto.
Ficou a tarefa
feita? Não, nem pensar! Depois vinha outra de responsabilidade, contar todos os
materiais necessários à obra, para poder ser feita a orçamentação. Ao fim e ao
cabo, a única coisa que interessava ao cliente.
O projectista,
contou milhares de barras, de dimensões variadas e de perfil diferente. Umas
cantoneiras eram em 140, outras em 160, outras em 225, bastantes em 300 e
algumas em 345.
Esta escolha
dependia dos esforços a que cada barra era solicitada na exigência máxima.
Depois era a
difícil contagem dos parafusos, eram dezenas de milhar dos normais, milhares
dos de alta resistência e muitos de mola.
Havia quatro
escadas com sua complexidade. Dezenas de corredores e varandins com centenas de
pranchas perfuradas. Havia prateleiras de várias dimensões aos milhares. Havia
os esquadros de travamento, assim como as sapatas especiais chumbadas ao chão.
Depois desta
exaustiva contagem com muita responsabilidade, estava tudo?
Não! Era preciso
recontar por outro método, só assim havia garantias de não haver erro na
contagem com consequências no preço final da obra. Prejuízos que iriam reverter
para a empresa fornecedora.
A seguir era
preciso fazer a orçamentação propriamente dita assim com o relatório. Finalmente
organizar as pastas com o processo completo.
Com as diversas
etapas, passara-se quatro dias e três noites, num árduo trabalho quase sem
paragem.
Qualquer outro
técnico da empresa, levaria quase duas semanas a fazer aquele projecto
orçamento. Isto se o soubessem fazer...
Como já disse,
este projecto era fundamental para a sobrevivência daquela empresa de
estruturas metálicas.
Enquanto no
gabinete o idoso projectista fazia aceleradamente a árdua tarefa, o vendedor
responsável por vender a obra, passava os dias no café ou passeando pela
cidade, fingindo que visitava clientes. Uma grande balda!
Perante um
projecto tão complexo e importante, o vendedor devia passar parte do dia perto
do velho projectista para se inteirar de tudo e poder apresentar as mais-valias
ao cliente. Mas nada disso o vendedor fez…
Após o projecto
feito, orçamentado e o processo montado, o vendedor foi chamada para o levar ao
cliente, empresa importante na área dos Super Mercados.
O técnico de
vendas era medíocre, não entendia nada do projecto. Era como um boi a olhar
para um palácio. Muito atrapalhado pediu ao velho projectista para ir com ele
ao cliente.
O velho sentiu-se
usado, lixado, recusou!
Então o coirão ia receber uma alta comissão e ele, o
cérebro do projecto ainda tinha de ir vender o mesmo…
- Vai falar com o teu chefe e pede ajuda.
Ele é pago para isso.
O vendedor contrariado assim fez.
Passando um pouco o director de vendas chegou ao
gabinete do idoso projectista. Todo pipi, todo cagão, todo incompetente. Para o
dito cujo, os seus negócios privados eram mais importantes do que os da empresa
onde recebia chorudo vencimento. Ao chegar perto do nosso projectista, assim
falou.
- Senhor X, o projecto e a venda é muito
importante para a nossa empresa, venha lá ajudar a meu vendedor. O patrão
ficará satisfeito, de contrário terás problemas.
O velho projectista aí ficou pior que um urso zangado.
A tampa saltou e ele desabafou em voz alta.
- Coirões, incompetentes, vós sois quem tem
a obrigação de vender. Andam nas putas e no fim têm os lucros. Vão-se fornicar!
Depois pensou mais aliviado.
- Porque estou a chatear-me? Estou já
reformado, estou aqui de borla, dando uma ajuda. Vou-me já embora e os gajos
que se fodam.
Após pensar isto, o velho idoso acordou, com o coração
acelerado, mas aliviado.
Fim
José Bray, 16/12/2014
Nota - Foi mais um sonho recorrente do meu tempo de
projectista. Foi um sonho mas com muito de verdade. Sonhei este tormento, na
noite de 14 para 15 de Dezembro.
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