quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Milagre de Natal (2)


João caminhava lentamente para casa, era de véspera de Natal, o dia estava húmido e frio. A tarde chegava ao fim e em breve a noite desceria sobre a cidade. Em casa duas crianças esperavam desesperadamente por ele.
O rapaz ainda novo, mal ultrapassava os trinta, apressou o passo, queria estar com os seus meninos o mais rápido possível. Tinha contudo ainda de resolver uma questão melindrosa, comprar os presentes para a Ana e a para o Luís, os seus gémeos. A menina queria uma boneca que há muito vira numa montra da Morais Soares e ele um revolver de plástico, que passara os dias a namorar defronte da montra da mesma loja de brinquedos.
Tudo seria muito simples, o problema é que ele não tinha o dinheiro para comprar os presentes tão desejados pelos filhos. Estava há muito desempregado e a divida ao merceeiro era muita e a renda do quarto estava atrasada já três meses. O Santos da loja e o senhorio Lopes, já tinham ditado a sentença. Ou aparecia o dinheiro, ou acabava a comida e a casa.
Que fazer?
Não visualizava qualquer solução… talvez roubar alguém com ar de abastado. Mas faltava-lhe a coragem e também o expediente.
Desde que morrera a sua amada sentia-se totalmente perdido. Mas os filhos tinham de comer e queriam que o pai Natal lhes trouxesse os brinquedos desejados.
Sem forças para tomar uma iniciativa ou para caminhar a centena de metros que o separavam do quarto em que sobrevivia com os filhos, sentou-se no banco da paragem dos autocarros. Uma amargura e um desespero imenso apoderaram-se do jovem homem. Não tardou que a emoção envolvesse o seu magro corpo, ao pensar nos filhos e na companheira desaparecida, mãe dos meninos.
Com a cabeça entre as mãos, por sua vez estas apoiadas nos cotovelos que faziam suporte nos joelhos cobertos pelas coçadas calças, o homem começou a chorar de mansinho, mas as lágrimas eram um rio deslizando pela cara cheia das marcas da fome.
Que fazer? Meus queridos filhos…
Não sentiu logo, mas aos poucos apercebeu-se de uma leve pressão no ombro esquerdo. Uma mão pequena batia ao de leve, aos poucos João foi-se apercebendo disso. Olhou!
Um sorriso maravilhoso olhava para ele, era a mulher mais linda que vira na vida. Seria um anjo?
- Porque choras meu rapaz? Diz-me o que se passa?
Sem conter as lágrimas o jovem homem abriu o coração. Devido à emoção atrapalhadamente deu algumas informações à senhora que entendeu logo o drama. Também ela há muito vivera situações semelhantes.
Então sem hesitar não só deu dinheiro ao João para as prendas como o convidou e aos filhos a passar a noite de Natal com ela e com sua filha uma menina da idade da Ana e do Luís.
João de imediato foi comprar as prendas para os filhos e à hora marcada lá estava à porta da casa da sua benfeitora.
Foi uma noite mágica para aquelas três crianças, para o João e para a maravilhosa senhora, tão bonita por fora como por dentro. João levou um ramo de violetas e recebeu uma foto de mãe com a filha. Há meia-noite uma luz multicolor brilhou forte na sala onde as crianças felizes abriam os presentes.
Os dias passaram e novo ano chegou, com ele a esperança na vida. Tudo começou a correr bem ao João, conseguiu um trabalho seguro e uma nova namorada entrou na sua vida.
Um dia João decidiu ir visitar a sua benfeitora. Vestiu os gémeos com roupa de domingo, comprou um ramo de rosas brancas, dirigindo-se depois para a morada em que estivera na noite de Natal.
A rua parecia-lhe mais velha e suja. Ao chegar ao prédio, este estava quase em ruínas com nítida falta de conservação. O homem entrou no edifício e bateu à porta. Apareceu-lhe uma velha muito velha.
- Que deseja?
- Venho visitar a senhora da casa. Ela está?
- Claro que está, a senhora da casa sou eu.
O homem com as crianças ao lado ficou confuso, tirou uma foto do coçado casaco e mostrou à velha.
- Falo desta senhora e da sua menina.
A mulher olhou atentamente para a fotografia abriu muito os olhos e exclamou espantada.
- O senhor ou está a brincar comigo ou está doido. Essa senhora morou aqui com a filha há mais de cinquenta anos. Há muito que morreram.
 O homem ficou aparvalhado, mas ainda perguntou.
- Mas como morreram, mãe e a filha?
- Sim homem de Deus, morreram num acidente quando regressavam de avião do estrangeiro.
Como era de esperar, João compreendeu que naquela noite de Natal, foi um milagre o que aconteceu. Os filhos não entenderam nada mas ele não mais esqueceria na vida, aquela mãe e sua filha.
Comeira, 13 de Dezembro de 2014
Dedicado à Francisca, sua mãe e sua avó!

José Bray

Sem comentários:

Enviar um comentário