terça-feira, 31 de março de 2015

Cooperantes - Djapam

02 – Djapam
Quem é Djapam? Sou eu, o escriba desta estória intitulada de “Cooperantes”. Filho de um preto e de uma branca. É verdade, sou um mulato, mas com muito orgulho em o ser.
Meu pai, que era um velho sábio, repetia muitas vezes uma frase que me viu crescer: dizia ele.
“Os pretos nunca serão livres enquanto não gostarem de ser pretos, os mulatos têm de entender que há mais do que branco e preto na natureza e os brancos só serão gente quando forem enegrecidos pela vida”.
Era o raciocínio de um filósofo empírico, grande senhor da floresta, dos rios e do capim.
Tenho honra em ser mulato. Realmente no mundo há as cores do arco-íris e também todas as misturas possíveis. Meu pai tinha razão…que descanse em paz. As suas cinzas há muito foram lançadas nas águas do rio Cuanza.
Esta narrativa fala de um tempo que vai de Abril de 74 até fins de 77, durante todo esse espaço de mil e trezentos dias, mais dia, menos dia, vivi com a minha preta numa vivenda da Vila Clotilde, espaço que meus pais compraram com o sacrifício de uma vida. Hoje passados cerca de quarenta anos, já velho, ainda lá vivemos. Nesta casa, nosso paraíso, nasceu toda a minha filharada.
A minha residência a que chamo casa encantada, tem uma estória no passado que merece ser contada se para tanto me der o engenho e a arte. Foi uma transcrição oral do meu amigo José Brandão, que conheceu os residentes e ao saber da coincidência da minha morada, fez o favor de relatar o passado do residente anterior que ele conhecia bem. Isto aconteceu no dia em que partiu para Portugal numa viagem sem retorno. Inclusive, deixou-me um manuscrito com o texto.
Sinto que nasci para a escrita, saí à minha mãe que era professora muita virada para as letras. O meu pai era sábio mas a minha mãe sábia era, além disso tinha sido muito enegrecida pela vida. Hoje dedico-me a pregar a palavra de Cristo, opção tomada exactamente no fim da saga que descrevo.
Há muito que desejava escrever este livro, mas ainda não tinha tido coragem. Foram tempos épicos da história do meu país. Foram tempos de muito amor, amizade e solidariedade, devido às óbvias e excessivas dificuldades. Finalmente este ano, já no décimo quarto do século XXI, senti um apelo a essa escrita. Não por nós que a vivemos, mas como herança aos nossos filhos, netos e por aí afora.
O relato, que faço nos “Cooperantes”, tem a intenção de dar a conhecer algo daquela época, Que coisas que se faziam, que tipo de gente era aquela que por cá andava. Como actuavam aqueles que, primeiro eram terroristas, depois libertadores, mais tarde políticos e por fim poder, ou seja governo. Talvez no fundo não fossem nada disso, mas sim aprendizes de tudo um pouco.
Heróis foram aquelas gentes anónimas, pretos, mulatos, brancos e de mais cores, que ajudaram a ser o que hoje somos, tanto portugueses como angolanos ou de outras nacionalidades. Gostaria que se fizesse alguma luz e justiça também.
As pequenas estórias relatadas nos “Cooperantes”, interligam-se e têm sempre uma moral e uma informação, não estão só por estar. Tudo é verdadeiro, excepto algumas magias. Alguns personagens estão debaixo de pseudónimos, outras são mesmo de ficção. Assim acontece com as empresas e os produtos fabricados.
Os anos passaram e muitos já partiram, um dia nenhum de nós estará por cá, mas andarão os descendentes, e os “Cooperantes”, será uma obra de homenagem aos seus antepassados, intérpretes de uma saga muito especial, o nascer de Angola como nação, considerada por muitos a terra prometida.

Vamos ao trabalho… 9/1/2014
Djapam

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