O toque no Renault 11
- Meus queridos e
adorados detractores, não posso de deixar de contar o meu sonho da última
noite. Já sei que vão deitar abaixo o conteúdo do mesmo, não importa porque me dá
gozo fazer a sua narrativa. Aguentem! Também aguento a kizombada que estou a
escutar no youtube.
No meu carro de cor preta, um Renault 11, ia ao cair da tarde
deslizando por estradas secundárias da zona saloia. Ao meu lado um amigo
fazia-me companhia na deambulação.
Ao passar numa pequena aldeia, senti um toque muito ao de
leve na parte traseira do lado direito da minha viatura. Tive a percepção que
nada de grave acontecera, mas pelo sim pelo não, decidi encostar e parar o 11.
Queria esclarecer a causa…embora o meu amigo insistisse para o não fazer. – É pá, não foi nada, não te incomodes, não
pares.
Um Datsun 1200, com mais de trinta anos estava ligeiramente
inclinado como querendo sair do estacionamento e entrar na via. Era um carro
verde, cor queimada pelo sol e pelo tempo, cheio de mazelas, muitas devido a
incompetência e desmazelo.
Dentro do carro saiu um velhote, tal como eu, mas mais
queimado pelo sol e pelo vinho. Vinha com uma expressão de zanga. – Bateste, agora tens de pagar a pintura do
meu carro!
Deu-me uma brutal vontade de rir, contive-me e contive o meu
amigo, por sinal um policia reformado e com pouca paciência para aquele tipo de
dislates.
Rápido, tínhamos compreendido o sucedido, o homem quis entrar
na estrada, não olhou e por pouco não se enfeixou no Renault. Acontecera um
toque de nada, não se via efeitos no meu carro nem no carro do reclamante.
Em breve espaço de tempo, vários amigos do velhote se juntaram
a apoiar o mesmo, eram idosos como ele, também queimados pelo sol e pelo álcool.
Até o taberneiro apareceu com um livro de facturas na mão, assim como uma
rapariga de tipo moderno, cabelo comprido e olhos brilhantes, que apreciava a
cena com um sorriso irónico. Todos davam razão ao amigo, a rapariga não, só
gozava a cena. O homem mostrava a todos, uns riscos nas portas do velho Datsun…
Tudo aquilo era um tremendo disparate, o meu amigo queria
partir para a briga, ou então partir deixando a velharia a falar para as estrelas,
porque entretanto fizera-se noite. Não quis nenhuma destas soluções, agredir
nunca e partir também não. Eles podiam tomar nota da minha matrícula e orquestrar
uma estória à maneira deles. Decidi seguir outro rumo, ou seja outra estratégia.
– Pronto, não há problema vou chamar a policia…
Rápido a atitude do homem mudou. – Senhor, não é preciso a polícia, podemos resolver isto a bem.
Não aceitei como era óbvio. – Vem a polícia e mais nada, não estou para vos aturar, Rui liga ao Posto
da Guarda Republica. – OK! Disse
o meu amigo.
O taberneiro exclamou com ar desiludido. – Agora o livro já não serve para nada. De
seguida afastou-se e entrou na taberna.
O condutor do Datsun entrou em pânico e garantiu nada querer,
que era tudo a brincar.
A rapariga moderna de cabelos longos e olhos brilhantes,
chegou junto a mim e interrogou-me. –
Diga lá o que se passou, estou curiosa?
Para fim de festa expliquei-lhe. - É óbvio que a culpa é do velhote que se meteu à estrada sem prudência.
Felizmente nada de grave aconteceu, nem riscos nos carros aconteceram. O homem
está com o grão na asa e se calhar nem carta tem. Repare que ele reclama a
pintura da porta do lado direito e o toque foi na porta do lado esquerdo. Adeus
menina e tudo de bom!
Após o esclarecimento, meti-me à estrada e parti mais o meu
amigo. A rapariga de cabelo comprido e olhos brilhantes deu uma sonora
gargalhada que ecoou nos nossos tímpanos durante algum tempo.
Comeira, 29/11/2013
José Bray
Nota: Já me desfiz do meu Renault 11 de cor preta, há mais de
quinze anos.
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