segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Regresso à Montanha Mágica

0 – Introdução
Vamos regressar à Montanha Mágica. Vamos voltar aos nossos amigos. O velho Sábio que inventou o xadrez e sua cadela Morgana, o herói capitão Valente e seu cavalo, príncipe Branco, príncipe Preto, o rei da cidade Branca, o rei da cidade Preta, o Dragão. Vamos conhecer a Bruxa má, principal inimiga do Sábio. Vai aparecer a bela Caissa neta do Velho da montanha e deusa do xadrez.
No primeiro trabalho, intitulado “A INVENÇÃO DO XADREZ”, escrito em mil novecentos e noventa, havia uma ligação entre o mundo real e outro mundo, do tempo sem tempo.
Neste segundo texto, vamos começar a ter uma ideia da geografia desse mundo mágico, ainda sem uma designação específica. Na primeira história, praticamente tudo gira á volta da Montanha Mágica. É feita uma narração contada na actualidade dum passado longínquo mas não codificado, pode ter sido há mil anos, dois, ou três ou simplesmente noutra dimensão ou noutro planeta. Neste segundo trabalho o tempo é intemporal. Mas a acção é toda no momento da narração.
Aqui já se dá mais ênfase ao bosque, já se fala um pouco dos rios, também do oceano Fantasia. Contudo a montanha continua a ser o centro da acção, e o epicentro da geografia da região. A montanha faz parte de uma cordilheira, mas tudo se confunde nas suas dimensões. No lado ocidental temos na parte norte o imenso bosque que se estende até ao oceano, na parte sul temos grandes e misteriosas florestas. Mas que há lá muito para o sul? As montanhas nunca acabam? Ou serão contornadas por mais florestas? Mistério… E para leste das montanhas o que há? Mistério…
Muitos outros mistérios se escondem. O feiticeiro saberá? Mistério…E povos, não haverá? Mistério…
Em futuras narrativas talvez se vão descobrindo alguns mistérios, os atrás referidos, ou outros segredos.
Será que o mundo actual conseguirá com a magia do xadrez contactar esse mundo fantástico?
Penso que sim, que iremos conseguir uma ponte imaginária, tipo arco-íris que nos levará até aos festivais de xadrez. Pensamos que o sábio da montanha mágica poderá dar uma ajuda.
Tenho sempre o recurso de tentar estabelecer contacto com a deusa Cássia.
Uma deusa Celta disse-me um dia, era eu criança, que havia por Avalon uma forma de chegar à Montanha Mágica.
Em qualquer das formas vou continuar a investigar.

I – O Festival
No sopé da montanha mágica, existe um extenso bosque de rara beleza. Ninguém sabe calcular a sua dimensão. Para sul é imenso, liga com uma densa floresta que vai até ao fim do mundo conhecido, para além desses limites só alguns viajantes mais aventureiros têm coragem para penetrar. O bosque liga a norte e a leste com a montanha. A oeste fica o oceano da Fantasia, nele desaguam inúmeros rios que correm das montanhas, floresta e do bosque, entre eles o rio Mágico que vem de longínqua floresta, percorre o sopé da montanha, e junta-se no bosque ao rio Real. Só o sábio da Montanha Mágica sabe aonde nasce este rio.
O bosque é na verdade muito belo, árvores de grande porte abundam por todo lado, plátanos, castanheiros, pinheiros manso rubras acácias, junto aos riachos salgueiros e chorões. Flores por todo o lado, de todas as cores e feitios. Amarelas, brancas, vermelhas e azuis, são predominantes, mas há muito mais, dezenas e dezenas. Verde, há de todos os tons. A passarada é impressionante, há centenas de espécies, por todos os galhos e arbustos, transformando o bosque num imenso concerto, que começa no raiar do dia e só acaba noite escura. As abelhas, besouros e cigarras fazem acompanhamento e o vento de tempos a tempos, também dá uma ajuda, umas vezes em brisa ligeira, outras com forte ventania. As árvores de fruta abundam com seus frutos saborosos e refrescantes. Por todo o lado se vêm animais a correr e a esconderem-se quando necessário. Os que mais se vêm são os coelhos, lebres, ratos do campo, doninhas, raposas, esquilos, cobras, lagartos, aves de rapina e muitas outras espécies. No bosque, nascem, vivem e morrem em harmonia com a natureza. Nos lagos, rios, ribeiros e riachos, de águas límpidas, abundam todo o tipo de peixe. Animais ferozes, ursos, lobos e dragões, vivem nos planaltos da montanha mágica. Raramente descem ao bosque, muitas vezes vão para a densa e misteriosa floresta.
Enfim… Um paraíso deslumbrante, a condizer com a magia da vasta região.
No bosque existem muitas clareiras, mas há uma que é especial, rodeada de árvores milenárias, que dão sombra todo ano. A clareira é ampla com cerca de cem passos de diâmetro. O espaço livre está todo alcatifado com relva curta verde e sempre fresca. Num dos extremos passa o rio Real que fornece água às duas cidades. Logo a seguir à grande clareira o rio bifurca em dois, um segue para norte para o reino das Pretas, o outro segue para sul para o país das Brancas. As duas cidades ficam distanciadas cerca de dez horas a trote de cavalo.
Neste cenário, todos os anos, os jovens das duas cidades, juntam-se por duas vezes para conviver e jogar os mais variados torneios de xadrez. Durante quinze dias os meninos e as meninas dos dois reinos estão acampados na clareira do bosque. A rivalidade é enorme, travam-se tremendas batalhas nos tabuleiros. Mas tudo acaba sempre em bem. Aproveitam para conviverem, angariar novas amizades, muitos amores iniciam-se durante estes festivais. Os jovens das duas cidades, têm em comum uma coisa fundamental, o amor e paixão que dedicam ao xadrez.
No ano desta narração o acampamento recebeu duas centenas de jovens. Naquela rapaziada há bons jogadores, mas os dois mais fortes são os príncipes da cidade Branca e da cidade Preta. Durante o festival disputaram-se todo o tipo de provas, rápidas, semi-rápidas e lentas. No torneio principal a luta foi renhida e os dois príncipes acabaram empatados, ficando a decisão para o próximo festival.
No fim das provas fizeram-se cursos temáticos e por fim um seminário. Levantaram-se algumas dúvidas às quais ninguém deu solução, incluindo os dois campeões. Uma questão relacionava-se com o final de Bispo contra Cavalo, uma outra, era o final de Bispo de casas de uma cor contra Bispo de casas da mesma cor, outra questão era, Bispos de cor oposta As opiniões divergiram e não chegaram a nenhuma conclusão. Depois de muita discussão, no bom sentido como é evidente, o assunto ficou em aberto.
Os dois príncipes que eram muito amigos, decidiram! E assim falaram. – Vamos fechar o festival, no princípio da primavera, cá estaremos de novo e nessa altura já teremos as respostas.
Ficou tudo de boca aberta. Mas os dois jovens já tinham um plano em mente. A rapaziada feliz, voltou para as suas cidades para enfrentar mais um ano de estudo, que se avizinhava daí a duas semanas.
Entretanto, os príncipes ficaram na clareira, escreveram aos pais dizendo que iam viajar e que estariam de volta daí a quinze dias para o início das aulas. Na mensagem informaram que iam ter com o Sábio da Montanha Mágica para tirarem algumas dúvidas.
Encheram os alforges de comida e agasalhos. Pegaram nas armas, montaram os cavalos, um branco cor da neve o outro negro como o carvão. Partiram ao nascer do dia, o destino era o topo da Montanha Mágica.
Os rapazes tinham decidido ir visitar o Sábio da montanha, o ancião de barbas brancas que tinha inventado o maravilhoso jogo do xadrez. Iam lá para colocar as diversas questões levantadas durante o festival. Aproveitavam para matar saudades do mágico e da sua cadela Morgana.
Ao partir não faziam a mínima ideia das dificuldades que iriam encontrar. A caminhada era longa com muitos perigos. Inconsciência própria da juventude.

II – A Subida
Os dois cavaleiros sabiam que o caminho era difícil e a caminhada longa, a maior parte seria a subir. A casa do Sábio ficava quase no topo da montanha no monte mais elevado. Ao redor do pequeno castelo, praticamente não havia árvores, pequenos pinheiros nórdicos e alguma vegetação própria dos climas gelados. A neve abundava na maior parte do ano. Nesta altura, felizmente, não era época de gelo. Os rapazes sabiam tudo isto por ouvirem contar, especialmente ao capitão Valente que visitava regularmente o seu velho amigo, fazia isso em quase todas as estações do ano. Havia quem dissesse que ele vivia apaixonado pela neta do inventor do xadrez, Caissa. Esta é a Deusa oficial do xadrez, passava o tempo a percorrer o planeta fazendo a divulgação do jogo e dando assistência aos amantes do xadrez. Raramente estava com o avô e o valente capitão fazia muitas visitas em vão.
Mas voltando aos nossos heróis…O problema é que eles não sabiam com rigor o local da morada do Sábio. Tinham só uma ideia mas um pouco vaga. Partiram na mesma sem pensarem no assunto, ousadia da juventude. Disseram um para o outro. – Lá, no cimo perguntamos às pessoas!..
Não lhes passou pela cabeça que lá em cima não há praticamente ninguém. Há lobos, ursos, dragões, feiticeiras, um ou outro pastor, foragidos da justiça, o velho Sábio e pouco mais.
Os jovens não forçaram os corcéis, caminharam todo o dia a trote, era preciso poupar as energias das montadas. Pararam duas vezes para se alimentarem e descansarem um pouco. Água fresca, boa fruta e pasto, não faltava e os príncipes levavam bastante comida nos alforges.
Quando anoiteceu já tinham atingido uma razoável altitude. A noite ia chegar fria. Avistaram uma pequena gruta e decidiram passar lá essa noite. De imediato juntaram bastante lenha e acenderam uma forte fogueira. Deram ração aos cavalos, os jovens jantaram alimentos que traziam nos sacos de pele. Meteram-se o mais possível dentro da gruta, todos incluindo os animais, reactivaram a fogueira, com as espadas e punhais à mão prepararam-se para dormir. Era preciso estarem atentos para enfrentarem qualquer assaltante, homem ou fera.
Adormeceram… sono inquieto… de repente os cavalos começaram a ficar impacientes. De imediato os rapazes ficaram despertos. – Que se passa? Falou um. – Já sei! São lobos. Respondeu o outro.
Na verdade, rapidamente confirmaram isso. Primeiro, um par de olhos no escuro, depois outro e mais outro. Por fim eram cerca de duas dezenas de lobos prontos a atacar, logo que tivessem uma oportunidade. Só o fogo os intimidava.
Os príncipes eram corajosos, bem constituídos e treinados para combater. Os cavalos também eram valentes. Prepararam-se para vender cara a derrota… O lume e a gruta eram bons aliados! De imediato reagiram. Os rapazes reforçaram o fogo, espada na mão direita e punhal na esquerda, protegidos na retaguarda pela gruta, aguardaram o ataque dos mais audazes. Por sua vez, os equídeos colocaram-se na posição ideal para dar uns eficientes coices.
A tensão era enorme, ninguém pensou mais em descansar. Ia ser uma noite de vigília.
Os lobos rodeavam a entrada da gruta a três quatro metros. Uivavam e faziam uma dança macabra, as vinte feras faziam um velho ritual para darem coragem uns aos outros.
Os príncipes, por sua vez, numa atitude temerária, agrediam verbalmente os bichos, demonstrando não ter medo e para os intimidar. Os cavalos relinchavam para tornar a cena mais patética.
Por fim, uma ou duas horas depois, três lobos avançaram armados em campeões. Dois foram projectados por coices dos cavalos e o terceiro foi ferido de morte por um golpe certeiro de uma das espadas. Afastaram-se gravemente feridos e já moribundos foram de imediato atacados e devorados pela alcateia em peso.
Com isto as coisas acalmaram e pouco a pouco chegou a alvorada vinda do leste. Os lobos já saciados começaram a desandar com que envergonhados.
Os nossos aventureiros, descansaram um pouco. Alimentaram-se com frutos secos e boa água, pura mas fria. Ainda exaustos por uma noite de luta e vigilância, partiram para continuar a sua saga. Agora mais atentos, porque finalmente entenderam que se tinham metido numa alhada e não num simples passeio.

III - Pânico
Entretanto, longe da Montanha Mágica, para lá da clareira do bosque, junto ao oceano da Fantasia, nos respectivos palácios os reis receberam as mensagens dos príncipes a informarem que iam partir para a montanha. Os soberanos ficaram em pânico e de imediato marcaram encontro no vértice das diagonais do rio Real, rio que abastecia as duas cidades. Era este o local em que os dois monarcas se encontravam para tratar de assuntos com interesse para os dois reinos. Uma pequena mas acolhedora estalagem servia de sala de reuniões.
Os dois reis após a última guerra entre os dois reinos, descrita na saga anterior, ”A Invenção do Xadrez”, decidiram que sempre que houvesse qualquer tipo de conflito ou problema, eles de imediato iriam resolver juntos a situação, para esses encontros mandaram construir a meias, a estalagem que ficou situada na fronteira dos dois domínios. A estalagem da Concórdia como ficou designada
Horas depois já estavam reunidos com os seus conselheiros. A montanha era muito perigosa e os rapazes corriam graves perigos. Se conseguissem chegar ao reduto do sábio, ele não os deixava regressar sem segurança. Mas os príncipes não sabiam o local da residência. Para além dos riscos, como lá iam chegar?
Os reis nem precisaram da opinião dos conselheiros, que por sinal em certas matérias eram bastante ignorantes. Só tinham a mania que sabiam tudo… Os soberanos decidiram em consenso! – Chamem o capitão Valente, só ele sabe como funciona a montanha e conhece os melhores caminhos para casa do velho. Era assim que eles travam o feiticeiro, mas diziam isso com carinho.
O capitão apresentou-se de imediato, já esperava ter a honra dessa difícil missão, apareceu montado no seu imponente corcel branco.
Os reis exigiram!..
- Parte e não apareças sem os meninos!
E o herói partiu sem mais delongas.

IV – A Bruxa
Entretanto, na montanha os príncipes continuavam a avançar, sempre subindo. Precisavam de descansar, mas não sabiam onde. Não tardaria a chegar a noite, depois vinha o frio e se os lobos voltassem a aparecer seria muito complicado. E no dia seguinte que plano teriam? Não encontravam alma viva excepto bichos ao longe.
Pararam um pouco para os cavalos recuperarem forças. Olharam em redor, era só rochedos, estavam a tentar encontrar uma gruta em sítio inacessível às feras.
A pé deram uma volta. De repente não muito longe, começaram a ver fumo. Avançaram com cuidado, não fossem estar alguns foragidos à justiça, aí escondidos. Ao virar junto de vários penedos apareceu uma cabana de madeira. À porta estava uma velhinha com muito bom aspecto, com um largo sorriso acenou aos jovens. Estranharam e com alguma prudência foram-se aproximando. Dois rapazes fortes e armados que perigo podia haver?
A cabana ficava junto de uma cascata e tinha um jardim com lindas flores. Coisa estranha naquela altitude…
- Então meninos que fazem por estas paragens? Qual é o vosso destino?
A idosa senhora tinha realmente uma expressão de bondade nos olhos. Os príncipes desarmaram e mais confiantes, falaram.
- Sabe senhora, vamos ao encontro do Sábio da montanha, sabe onde fica a morada dele?
- Claro que sei! Sou muito amiga dele.
Dito isto deu uma risada e os olhos brilharam intensamente. Os rapazes de tão cansados não repararam. Ela continuou.
- Ficam cá esta noite, jantam uma sopinha quente, fazem um bom soninho e amanhã recuperados vão ter com o vosso amigo. Eu ensinarei o caminho, não estejam preocupados.
A noite caiu, escura de breu. A velha apresentou uma sopa de excelente aspecto. Os rapazes comeram e de repente adormeceram como pedras. Os cavalos também foram alimentados com uma erva especial, também eles entraram em sono profundo. Estariam todos excessivamente cansados?
Assim que os príncipes e cavalos adormeceram, a mulher sofreu uma tremenda metamorfose.
Ficou dez vezes mais velha, com aspecto horroroso e maldoso. Era a bruxa má da montanha, Odiava o feiticeiro e a sua neta Caissa. Odiava o jogo de xadrez e queria vingar-se do sábio.
Ela sabia o que queriam os jovens e foi a oportunidade de ajustar velhas contas com o inventor do xadrez e seus amigos. Transformou os rapazes em gatos e os cavalos em porcos. Depois desfez um feitiço, a cabana e o jardim desapareceram, em seu lugar apareceu um inacessível castelo, em estado miserável, escondido no meio dos escuros penhascos, impossível de ser visto excepto do céu. Faziam companhia à velha pequenos monstros alados de pedra, ratazanas, aranhas, vampiros e cobras.

V – O Capitão Valente
Entretanto o capitão Valente começou a cavalgada a partir da grande clareira. Queria apanhar o rasto dos jovens, com facilidade isso aconteceu.
Começou a subir a montanha com desembaraço, sempre atento a todos os sinais e ameaças. Ele era o herói de toda a região, como tal nada lhe escapava.
Cavalgando, recordou os tempos da guerra entre Brancas e Pretas, a salvação do jovem príncipe e a invenção do xadrez, hoje jogo oficial dos dois reinos e doutras regiões mais distantes. Recordou a luta com o belo dragão que poupou e depois ficaram amigos para sempre.
Mais tarde, o herói começou a pensar na bela Caissa, paixão de sua vida. Que saudades tinha da Deusa do xadrez. De repente começou a pensar em voz alta. – Acho que ela também gosta da minha pessoa! Mas anda sempre através do mundo a proteger o xadrez. Não quer ter compromissos para poder estar sempre disponível para a sua missão. Além disso é imortal. Um dia serei velho e ela será sempre jovem.
Com estes pensamentos, Valente chegou junto do primeiro acampamento dos rapazes. Estudou o local com atenção e compreendeu o que se tinha passado. – Eles salvaram-se! Porque se tivessem sido devorados, as roupas, arreios e armas estariam aqui. Os lobos não comem cabedal nem aço.
Dizendo isto, arrancou. Primeiro a missão, depois o descanso. Era assim o nosso grande capitão. – Amigo, desculpa mas temos de viajar de noite. Paramos de vez enquanto para descansares, eu descanso na sela.
O inteligente animal, companheiro de muitas aventuras, abandonou a cabeça concordando com o dono.
Estava a amanhecer quando ele apareceu, enorme, batendo com as patas no peito e dando urros tremendos. Era um urso castanho da montanha, famosos pela sua ferocidade e inteligência.
O capitão podia partir a galope e fingir que não via a provocação. A sua missão era outra. Mas… a gigantesca fera estava no seu caminho, ocupava o estreito desfiladeiro por onde ele tinha de passar.
Valente desceu do cavalo, não queria o seu amigo ferido. Se fosse derrotado o corcel poderia voltar a casa e informar os reis do seu fracasso. Nesse caso eles mandariam os seus exércitos.
A luta foi terrível! O capitão escolheu a lança para enfrentar a fera. Depois de muitos avanços e recuos, o nosso campeão já com algumas feridas conseguiu encurralar o urso. Este não tinha espaço para manobrar e Valente ia cravar a afiada lança no coração da fera. Antes olhou uma última vez para o focinho do animal. Viu uma súplica tão grande nos olhos do urso. Não teve coragem para a estocada final. Recuou uns passos e a fera com grandiosa dignidade e um sorriso nos lábios avançou montanha dentro. Ao longe olhou para trás como para agradecer, virou costas e partiu. O capitão Valente, tinha conquistado outro amigo, como acontecera há muito tempo com o dragão.
Tratou como pôde das feridas e partiu novamente montanha acima.
Continuou a seguir o rasto, com mais ou menos facilidade. De repente parou, junto a um penhasco as pegadas desapareciam como por encanto. – Estranho, eles não podem ter-se evaporado…
Não sabendo que fazer arrancou velozmente para os rochedos, local onde estava o pequeno castelo do velho da montanha.
O seu cavalo subia cada vez mais a custo, por fim o cavaleiro desmontou e seguiram lado a lado. Pouco depois chegavam finalmente ao seu destino. O lar do famoso feiticeiro.
As estrelas já brilhavam em toda abóbada celeste. Estava escuro, muito escuro era noite de lua nova, quando as bruxas estão mais activas.

VI – O Sábio
Sábio e herói, deram um longo abraço, era uma alegria muito forte sempre que se reviam. A cadela Morgana também estava feliz, mas sentiu de imediato que havia graves problemas.
O capitão narrou tudo o que sabia. O Sábio ouvia atentamente e ao mesmo tempo tratava as inúmeras feridas que o cavaleiro ostentava do seu último combate.
Finalmente o capitão calou-se. Ainda não reparara que atrás dele na penumbra uma bela jovem ouvia atentamente a sua narração.
O velho disse entretanto. – Estes rapazes são levados da breca, querem pensar só pela sua cabeça. Deviam ter falado com os pais ou contigo. Eu mesmo poderia ter ido ao vale dar umas explicações… Ou aqui a minha neta.
Dito isto com um ar malicioso apontou para o canto. A jovem avançou com toda a sua esplendorosa beleza. O capitão ficou de boca aberta.
- Fecha lá essa bocarra e dá cá um abraço ao teu amor.
Valente ficou vermelho que nem um tomate maduro, se não fosse o problema dos príncipes era o homem mais feliz do universo.
O ancião voltou a falar. – Esperem que eu vou dar comida e agasalho ao corcel. Caissa prepara o jantar, Valente põe mesa. Já venho.
Os jovens, mas adultos olharam-se cheios de ternura, amor e paixão. Estava ali um caso sério.
Um pouco mais tarde foram jantar, enquanto comiam iam trocando ideias e preparando um plano de acção. Em dada altura o velho da montanha, afirmou.
- Isto é malandrice da bruxa má da montanha. Ela odeia-me e não suporta o xadrez. Como não pode fazer nada contra a minha pessoa e contra a minha neta Caissa, está a vingar-se nos príncipes. Mas amanhã vamos dar a volta a isso.
Depois de um breve silêncio, Caissa acrescentou.
- Eu não consigo descobrir aonde ela está, mas consigo neutralizar o seu poder. Não consigo é anular os seus feitiços.
- Vamos todos trabalhar em equipa. Acrescentou Valente.
No dia seguinte ao alvorecer estavam todos preparados para a acção.

VI – A Acção
O sábio falou.
- O castelo da bruxa só é visível do céu e muda de lugar sempre que ela queira. Vamos chamar o teu amigo dragão, silenciosamente vamos voar e descobrir o local.
O ancião continuou.
- Depois faço um feitiço que sei e ela não consegue mudar as ruínas que são a casa dela.
Caissa acrescentou.
Descemos no pátio e com o meu poder não autorizo nenhum feitiço caseiro.
O sábio voltou á fala.
- Vão aparecer dois monstros de rocha que a protegem dos animais selvagens. Valente tem de os derrotar com a sua espada. Para isso vou envolver a lâmina num óleo mágico para ela não quebrar.
- Mas como quebrar o feitiço que ela deve ter feito aos príncipes e aos cavalos? Perguntou a capitão preocupado.
- Deixem isso comigo. Falou o velho e continuando. – Depois de cumprirem a vossa parte vou ameaçar cortar-lhe o pescoço. Devido a isso ela vai propor um enigma que eu tenho de descobrir. É uma maneira de ela salvar a dignidade de bruxa.
O Valente ficou de olhos arregalados. – Mas como sabe que a malvada reage assim?
- Já a conheço há muitas centenas de anos, já travámos muitas batalhas. Por isso já a topo à distância.
Entretanto o capitão tocou a sua famosa trompa e meia hora depois o dragão seu amigo apareceu, belo como sempre. Recebeu calorosos cumprimentos de todos e rapidamente entrou no espírito da missão. Deitando uma chama radiosa que mais parecia o arco-íris, mas com o focinho para cima.
- Vamos embora, vamos ao ataque. Disse a deusa.
- Vamos! Confirmaram todo.
Na verdade, tudo decorreu conforme instruções do Sábio da Montanha Mágica.
No fim, ao ser dominada, não vendo outra saída, declarou cheia de prosaica.
- Eu só liberto os rapazes e os cavalos do feitiço se aí o velhadas conseguir responder ao enigma que vou lançar como desafio.
Conforme previsto ela assim reagiu. Os amigos sorriram uns para os outros com um olhar cúmplice.
O Sábio concordou, mas exigiu que se ela perdesse não chateava durante um século. Ela deu palavra de bruxa e com um riso velhaco, avançou com o enigma.
- Dois irmãos cumpriam tarefas no mesmo local, vezes sem conta. Mas nunca se encontraram cara a cara. Quem irmãos são esses?
O capitão Valente, ficou embaraçado, não sabia a resposta.
Caissa sabia mas não podia dizer. Tinha de ser o ancião de barbas brancas.
Com um sorriso nos lábios, o sábio afirmou.
- Nada é mais simples.
Depois de um breve suspende, declarou.
- É o par de Bispos. O das casas brancas nunca se encontra com o das casas Pretas.
Como por milagre, a bruxa evaporou-se e o castelo também.
Os príncipes apareceram belos e felizes com os altivos cavalos. Com se nada tivesse acontecido. Só se lembravam de uma simpática velhota que os abrigara e lhes dera uma saborosa sopa. Os amigos acharam que não havia necessidade de esclarecimentos por agora.
Foi uma alegria para a irmandade.
- Vamos festejar! Todos para casa do Velhote da montanha que sou eu.

VII – A Festa
Logo que chegaram ao acolhedor castelo do sábio, este deu ordem para serem enviados vários pombos de correio para os dois reinos a informar que os rapazes estavam salvos e de boa saúde.
Depois desta tarefa foram todos tratar dos festejos!
Ao meio dia. Já todos estavam à mesa na casa do ancião. Caissa com a ajuda do Valente, confeccionaram um almoço de luxo, melhor um banquete. Tudo à base de frutos, legumes, queijos, algas do rio e dos lagos.
O sábio, foi à adega buscar os sumos, néctares dignos dos deuses e dos reis. Algumas das bebidas tinham dezenas e dezenas de anos e tinham sido fabricados por ele próprio.
Os príncipes ficaram com a missão dos doces e eles safaram-se com muita classe. Tinham a mão afinada. Bem os faziam bem os comiam. De tempos a tempos davam umas miadelas para chatear a Morgana, olhavam um para o outro e encolhiam os ombros.
Durante toda a tarde foi comer e beber!
Depois foi cantar… cantar… cantar…
Todos dançavam, em especial Valente com a Caissa.
O Dragão ficou encarregue do fogo-de-artifício que ele cumpria com todo o rigor.
Por sua vez, a Morgana, jogava xadrez com os cavalos.
A festa durou noite dentro, a partir de dado momento começaram-se a contar as recordações. Por fim todos estavam cansados e sonolentos, a bebida ajudara muito nisso.
A dado momento o velho da montanha, decretou!
- Tudo para a cama. Amanhã vou explicar a estes meninos as questões que deram origem a estas aventuras. Vamos falar dos tais finais que todos questionaram no Festival de Xadrez.
O Dragão não podia ficar mais tempo. Tinha a companheira e os dragões pequenos à espera que já deviam estar preocupados, por isso, começou a despedir-se de todos. – Adeus amigos, capitão Valente quando precisares é só chamar com a trompa.
Os amigos agradeceram. O Sábio ofereceu-lhe um unguento que curava todas as feridas. Caissa deu-lhe um beijo que o encheu de alegria, os príncipes convidaram-no e à família, para visitarem as cortes, para receberem os agradecimentos dos reis. Por fim Valente deu um carinhoso abraço ao amigo de longa data.
O Dragão elevou-se no ar, deu uma série de piruetas no espaço, deitando fogo de diversas cores, escrevendo no escuro do céu. Até sempre amigos… Depois desapareceu direito ao seu lar.

VIII – A LIÇÃO
No dia seguinte. Enquanto Caissa e Valente passeavam através das paisagens da montanha, fazendo um autêntico namoro. Os príncipes sentaram-se em frente do ancião para este explicar os seus pontos de vista em relação às questões colocadas.
A Morgana também escutava atentamente.
Primeira questão, colocada pelos jovens. Num final de Bispo contra Cavalo quem tem vantagem?
O velhote pensou um pouco e calmamente respondeu.
- A vantagem de um lado ou de outro, depende sempre de vários factores. Mas primeiro vamos esclarecer uma questão que considero da maior importância. Tudo o que vou dizer é princípios, não são regras, por isso haverá sempre possíveis excepções.
- Por princípio o Bispo tem vantagem quando há peões nas duas alas e estão móveis. O Cavalo tem dificuldade em deslocar-se para as duas alas.
- Por princípio o Cavalo tem vantagem quando os peões estão numa só ala e estão bloqueados. Compreenderam?
- Sim grande mestre!
Segunda questão, colocada pelos jovens. Bispo bom Bispo mau, o que é isso?
- Este tema é muito interessante. Se tiverem ambos um Bispo das casas branca e se os peões do adversário estão bloqueados em casa preta, vocês têm o mau Bispo e o vosso adversário terá o Bispo bom. Este tema resolve muitos finais de partida. Espero que tenham percebido. Mais?
- Então e se forem Bispos de cor oposta? Perguntaram os jovens em uníssono.
- Isso é simples, de um modo geral a partida está empatada. Cada jogador controla metade do tabuleiro. Mas volto a chamar a vossa atenção… Há sempre excepções.
- Perceberam meninos?
Era evidente que eles tinham percebido…

IX – A Despedida
- O senhor é um sábio, muito obrigado.
De seguida os dois rapazes deram abraço forte e emotivo ao feiticeiro da Montanha Mágica.
Depois acrescentaram.
- Professor, queremos que no próximo festival, vá lá abaixo dar um curso de finais.
E antes de terem resposta, acrescentaram.
- Gostaríamos que Caissa e Valente casassem e fossem muito felizes.
O velho ancião com um sorriso triste esclareceu.
- Também eu gostava, mas é um amor difícil. O Valente é um herói mortal e Caissa é a deusa do xadrez, é imortal enquanto o xadrez existir. É triste mas vai haver muitos Valentes na eternidade dela.
Parou pensativo. Depois afirmou.
- É bom que eles vivam o momento e sejam felizes, agora mesmo…
No dia seguinte, ao acordarem, Caissa já tinha partido para viver o seu destino. Voltaria qualquer dia.
Despediram-se todos emocionados, ancião e Morgana tinham os olhos lacrimejantes.
Aos príncipes apertavam as mãos para disfarçarem a emoção.
O capitão Valente, herói de mil aventuras, não tinha complexos, deixou correr as lágrimas pelas faces marcadas por golpes de muitos combates.
Partiram. Ao longe o sábio e a sua cadela continuaram no seu posto de despedida. Depois ficaram cada vez mais pequenos, a seguir o penedo do castelo começou a desaparecer, por fim a bruma escondeu o topo da Montanha Mágica.
Embora tristes e saudosos, iam por outro lado contentes. Nos reinos das Brancas e das Pretas, esperavam-nos grandes festejos para a chegada dos heróis.

José Manuel Bray …………………………….Marinha Grande, 12-01-2006
……………………………Revisto………….......Marinha Grande, 05-07-2007
……………………………Nova Revisão……. Marinha Grande, 24-01-2011
……………………………Nova Revisão……. Marinha Grande, 21-02-2011

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Xadrez - Encontro Nacional de Escolas


Daniel Bray da Escola Acácio Calazans Duarte vence “Encontro Nacional de Escolas”
Disputou-se em 17 em Fevereiro no concelho de Alcobaça o XI “Encontro Nacional de Escola” vertente individual, cerca de trezentos jovens xadrezistas de ambos os sexos vindos de todo o país, lutaram por uma boa classificação.
No escalão dos mais velhos. 3º Ciclo e Secundário, concorreram cento e vinte jogadores, sendo uma vintena de grande categoria. Daniel Bray da Escola Acácio Calazans Duarte, venceu o campeonato fazendo uma demonstração de grande classe. No escalão dos mais novos perante cento e oitenta jogadores venceu com brilhantismo Francisco Cavadas do Externato da Benedita.
O distrito de Leiria está de parabéns ao conseguir travar o potencial dos grandes centros do país!

























sábado, 5 de fevereiro de 2011

Maria das Dores - vida e morte!

A minha trisavó Maria das Dores, sempre me fascinou, sinto que há algo de muito sedutor na sua história. Como não há fotografias nem pinturas sobre a senhora sinto-me no direito de a idealizar a meu gosto. Será uma linda mulher de pele clara, olhos azuis, longos cabelos cor de ouro, altura acima da média, bem composta de seios e pernas robustas, mas não demasiado fortes. Com esta descrição não estou a dar nenhuma novidade, estou a descrever a neta da Maria das Dores, minha avó Maria Henriqueta.
Maria das Dores, era uma bela adolescente que deslizava pelas sedutoras paisagens das Carreiras e Carvoeira, entre importantes Quintas e casas senhoriais. Os pais burgueses abastados, adoravam a sua menina e viam com orgulho a relação de amizade entre a moça e a fidalga da Quinta, Henriqueta das Dores. Foi então que apareceu o galã de seu nome José Bray natural de São Domingos de Carmões, homem apetecível cinco anos mais velho. A rapariga tinha dezassete anos e ficou louca de amor, daí aos actos foi um relâmpago, assim foi feito o primeiro filho ainda antes do casamento, nasceu a 22 de Março de 1868 a quem foi dado o nome de Silvério e foi meu bisavô. Mas voltemos atrás.
Maria das Dores filha de José Pereira e de Marianna das Dores nasceu na freguesia da Carvoeira no dia 20 de Janeiro de 1848, casando no dia 3 de Setembro de 1866 alguns meses depois de o filho nascer. Nessa altura a fidalga amiga contraía matrimónio com o visconde de Balsemão indo viver para a Quinta da Ermegeira! A viscondessa queria a amiga com ela e assim o jovem casal acompanhou a fidalga até à dita Quinta, isto no fim de 1866. José Pedro da Roza Bray foi contratado como feitor da Quinta e lá ficou a viver com a nossa Maria das Dores. Como escrevi noutros textos este foi o primeiro Bray a viver junto à Ermegeira a minha aldeia.
A vida na Quinta era feliz para todos e pouco a pouco foram nascendo os filhos ao casal Bray, de dois em dois anos, em 1868 a Maria Henriqueta (os viscondes foram padrinhos), em 1870 Luísa Maria, em 1872 Marianna, em 1974 Amélia, em 1877 José. Em 6 de Março de 1880 nascia um menino a quem foi dado o nome de António mas que faleceu nesse dia assim como sua mãe Maria das Dores.
Maria das Dores faleceu aos trinta e dois anos ao dar á luz o seu sétimo filho, o António!
O marido mandou construir um pequeno monumento em sua memória no cemitério do Maxial.
José Bray, trineto de Maria das Dores
Marinha Grande, 31 de Janeiro de 2011

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Xadrez - Tenho um sonho!

Sonho com um Xadrez para todos, onde sejamos iguais, sem distinção de raça, religião, sexo, política ou estatuto social!
Sonho para que o Xadrez seja apreciado por todos, na competição e na componente lúdica, sonho para que seja visto como uma ciência e uma arte, mesmo como uma filosofia, como afirmava o meu amigo Tarira.
Sonho para que o PODER um dia acorde e compreenda a importância do Xadrez na formação dos jovens!
Sonho com a fundação de um museu nacional dedicado ao Xadrez!
Sonho para que os dirigentes da modalidade não se esgotem em guerras de caca e dediquem o seu esforço em resolver os problemas da digna modalidade. Ela que nada fez para ser tão mal tratada!
Sonho para que todos tenham juízo!
José Bray